Querida Betina,
Esta é uma carta. Provavelmente, quando você puder lê-la, esse estilo de comunicação já estará extinto. Antes do e-mail, redes sociais e da inteligência artificial que, neste ano do seu nascimento, ainda dá seus primeiros passos – como você fará daqui a pouco – os seres humanos se comunicavam assim, escrevendo para pessoas queridas.
Ao longo da história, as cartas registraram confidências, selaram amizades, criaram vínculos. Nas palavras escritas em declarações como essa, Van Gogh, um artista incrível, contou para seu irmão Theo sobre um novo amigo, um carteiro da cidade de Arles, na França, que o acolheu em um momento sensível e importante.
Também, aqui no Brasil, artistas modernistas, escritores, pessoas comuns, se corresponderam registrando palavras em papel, com lápis ou caneta e enviando-as pelos correios. Os carteiros, como o anjo da guarda de Van Gogh, levavam e traziam saudade, amor e, por um tempo, em um país chamado Estados Unidos, transportavam até bebezinhos como você, nas suas icônicas sacolas penduradas nos ombros.
A notícia do seu nascimento não chegou a mim por carta. Infelizmente, elas já estão um pouco em desuso e já temos meios de comunicação mais instantâneos para contar novidades belas como essa. Mesmo não tendo sido à moda antiga, senti como se um carteiro tivesse deixado à minha porta um envelope branco, com meu nome e endereço no verso, o nome do seu pai e da sua mãe na frente e um bilhete caloroso dentro, escrito em letras trêmulas de emoção: – Ela nasceu!
Eu tenho 48 anos e, por mais que já tenha vivido cerca de metade da minha vida, se o tempo for generoso comigo, eu ainda não tinha conhecido nenhuma Betina antes de você.
Você é a primeira e eu tenho certeza de que não me esquecerei do seu nome. E pode acreditar, isso é um grande feito para mim! Minha memória não é boa para nomes e, preciso te confessar que, depois dos 45 anos e com a chegada de uma condição bem desagradável, chamada menopausa, ela piorou bastante. Ainda assim, sem esforço, seu nome ficará sempre gravado no meu coração por causa de um sentimento que vai permear toda a sua vida, a amizade.
A amizade fará você adotar pessoas desconhecidas como se fossem da família. Por alguns anos, essa sensação vai fazer você preferir a companhia de jovens – com gostos musicais, estilos de cabelo e de roupa duvidosos – à presença dos seus pais. Provavelmente, você desenvolverá um dialeto com seus amigos e amigas, que manterá em segredo suas aventuras em conversas indecifráveis para os adultos.
Você vai amar, apaixonar-se, sentir raiva, decepção, alegrar-se, sentir-se orgulhosa por suas conquistas e, em todos esses momentos, algum amigo ou amiga estará por perto, oferecendo um abraço e dividindo a vida como uma doação generosa de acolhida, paciência e carinho por você.
Seu pai é um amigo querido e, por esse vínculo com ele, essa completa desconhecida, que ainda nem te carregou no colo, tem certeza que, daqui para frente, a cada Betina que conhecer, você virá na memória.
Vou me alegrar quando você falar sua primeira palavra, dar seus primeiros passinhos. Meu coração vai sorrir ouvindo suas gargalhadas e poderei ver através dos seus olhos um novo mundo que só as crianças sabem explorar. Não importa se por carta, por algum meio digital ou por notícias de outros amigos. Saber de você vai ser sempre uma gioia!
Se você se parecer com seu pai, sua risada será generosa, você saberá desfrutar sua existência com alegria, seu trabalho será uma expressão da sua paixão pela vida e uma boa conversa vai ser, para você, um prazer que vai agregar os amigos. Conheço sua mãe por foto e, carregar os traços dela, fará de você uma menina linda e graciosa!
Seu pai é um padrinho espiritual da minha filha. Eu inventei essa categoria de apadrinhamento depois de ter um sonho muito realista e que me tocou muito, em que seu pai a protegia em uma situação difícil. Ela não tinha nem nascido ainda e sua alma já estava guardada por um ser humano muito especial, que você chamará de pai e eu tenho orgulho de chamar de amigo.
Minha querida Betina, desejo que seus caminhos sejam sempre de luz e que você irradie alegria por onde passar. No meu coração, você já plantou uma semente de felicidade.
Um abraço caloroso,
Lu Costa